"As grandes empresas suportam a estrutura económica, as pequenas empresas suportam a estrutura social"

Publicado em 7 de junho de 2025 às 10:52

O Equilíbrio Invisível: Porque Precisamos de Grandes Empresas… e de Pequenas Também

 

Vivemos numa era em que o debate sobre o tecido empresarial tende a oscilar entre dois polos: de um lado, a glorificação das grandes multinacionais como motores da economia global; do outro, a celebração das micro e pequenas empresas como sustentáculos da inovação local, da diversidade e da resiliência social. Mas este não é um jogo de soma zero. A estabilidade económica e social de qualquer país — Portugal incluído — depende do equilíbrio funcional entre os diferentes tipos de empresas. A desvalorização ou o colapso de qualquer um destes pilares pode gerar consequências profundas: desde o abrandamento económico até à desintegração do tecido social.

A falsa dicotomia

Ao longo da história económica recente, tornou-se comum ouvir que “as grandes empresas movem a economia” — e não falta evidência para isso. Com presença global, orçamentos bilionários e poder de investimento, as grandes corporações estão na vanguarda da inovação tecnológica, da produtividade e da competitividade internacional. Elas geram economias de escala, exportações em massa, e — talvez mais importante — têm capacidade de influenciar políticas públicas e de moldar cadeias de valor globais.

Mas, numa camada mais próxima da realidade do dia a dia, é nas pequenas e médias empresas (PME) que encontramos a espinha dorsal da coesão social. Segundo dados da OCDE e da Comissão Europeia, mais de 90% das empresas em atividade são PME, e estas são responsáveis por 60 a 70% do emprego no espaço europeu. São elas que contratam localmente, dão oportunidade a jovens sem experiência, absorvem a mão de obra das zonas interiores e asseguram uma distribuição mais equilibrada do rendimento.

Neste contexto, costumo dizer que as grandes empresas suportam a estrutura económica, enquanto as pequenas empresas suportam a estrutura social. Não se trata de atribuir mais valor a umas do que a outras — trata-se de reconhecer funções complementares e indispensáveis.

Quando o desequilíbrio gera desemprego

Se este equilíbrio se rompe, o impacto é imediato. Sem grandes empresas, não temos alavancagem económica, nem produtividade agregada, nem músculo financeiro para competir internacionalmente. Mas sem micro, pequenas e médias empresas, o sistema entra em colapso social: os índices de desemprego disparam, os territórios desertificam-se, e o tecido comunitário começa a esfarelar-se.

A história recente comprova esta relação. Durante a crise de 2008, em países como Portugal, Espanha ou Grécia, foi o colapso das PME que alimentou os números negros do desemprego. As grandes empresas, muitas vezes multinacionais, resistiram (ou foram resgatadas), mas as pequenas fecharam portas por milhares. Resultado? Comunidades inteiras ficaram sem sustento e as consequências sociais prolongaram-se por mais de uma década.

Mais grave ainda: quando os governos concentram os seus apoios exclusivamente nas grandes empresas (por exemplo, através de incentivos fiscais ou linhas de crédito restritas a determinadas escalas), acentua-se a desigualdade no ecossistema empresarial, dificultando o surgimento de novos negócios e perpetuando um sistema desequilibrado.

O erro da visão única

Há quem defenda que o futuro da economia passa apenas pelas grandes empresas tecnológicas ou pela inovação de vanguarda. Outros colocam todas as fichas no empreendedorismo de proximidade, feito de cafés, oficinas e negócios familiares. Ambas as visões estão incompletas.

A diversidade tipológica das empresas — desde o microempreendedor em nome individual até à multinacional cotada em bolsa — é o que garante a resiliência sistémica da economia. A estrutura empresarial de um país é como um ecossistema: retira-se uma peça e todo o sistema começa a desequilibrar-se.

Uma proposta: políticas de convergência empresarial

O que proponho não é uma utopia empresarial onde todos ganham sempre. Proponho, sim, uma política económica mais inteligente e equilibrada, baseada nos seguintes princípios:

  1. Apoiar o crescimento das PME com medidas reais de simplificação administrativa, acesso a financiamento proporcional e programas de formação e internacionalização.

  2. Valorizar as grandes empresas como âncoras do sistema, exigindo delas compromisso social, pagamento de impostos justos e reinvestimento local.

  3. Fomentar a interdependência entre grandes e pequenas empresas através de cadeias de fornecimento locais, subcontratação consciente e estímulo à inovação colaborativa.

  4. Reforçar a articulação entre políticas de emprego e políticas de apoio às PME, assumindo que os postos de trabalho sustentáveis estão mais frequentemente ligados ao dinamismo dos pequenos negócios.

Conclusão

As taxas de desemprego, os ciclos de pobreza, o êxodo rural ou mesmo o colapso de comunidades inteiras não são apenas indicadores sociais — são sintomas de desequilíbrio no modelo empresarial. Enquanto continuarmos a tratar grandes e pequenas empresas como rivais ou como entidades estanques, estaremos a comprometer a base da economia real.

Portugal, tal como muitos países, precisa de encontrar um novo equilíbrio. Um modelo que reconheça que sem grandes empresas não há escala, mas sem pequenas empresas não há sociedade.

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